O que Esperar da Economia Brasileira em 2026: Juros, Dólar e Investimento

06/11/2025

Por: Adriano Gadelha

Um Cenário de Convergência (e Desafios)

 

O ano de 2026 para a economia brasileira se desenha como um ponto de inflexão, onde os efeitos defasados da política monetária restritiva (juros altos) devem se somar aos desafios persistentes da política fiscal. A expectativa geral do mercado financeiro, refletida em projeções como o Boletim Focus do Banco Central, e as estimativas do governo federal, indicam um ritmo de crescimento moderado, uma inflação mais próxima da meta e taxas de juros em patamares ainda elevados, mas em tendência de queda.

Entender a dinâmica desses indicadores – Inflação, Taxa Selic, PIB, Política Fiscal e Monetária – é crucial para antecipar o comportamento do dólar e guiar as decisões de investimento no país.


 

1. O Desafio da Inflação e a Busca pela Meta

 

A inflação, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), é o termômetro central da política econômica. Para 2026, a principal meta do Banco Central (BC) é assegurar que a inflação convirja para o centro da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).

 

Projeções e Metas

 

Indicador Fonte Projeção para o Fim de 2026 Meta CMN (Centro)
IPCA (Inflação) Mercado (Focus) ~4,20% a 4,50% 3,00%
IPCA (Inflação) Governo (PLOA) 3,60% 3,00%

Nota: A meta de inflação do CMN é de 3,00%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos, ou seja, entre 1,5% e 4,5%.

Embora as projeções do mercado e do governo situem a inflação de 2026 dentro ou muito próxima do teto da meta (4,5%), isso não significa tranquilidade. A convergência é lenta e depende de fatores exógenos (como preços de commodities e o câmbio) e endógenos (como o crescimento do crédito e o mercado de trabalho).

 

Fatores de Pressão e Alívio

 

  • Fatores de Alívio: O principal fator de alívio é o efeito defasado da taxa Selic elevada praticada nos anos anteriores, que desaquece a economia e reduz a pressão da demanda sobre os preços.
  • Fatores de Pressão: A principal pressão vem da incerteza fiscal. Um aumento percebido no risco fiscal pode desancorar as expectativas de inflação, forçando o Banco Central a manter a taxa Selic mais alta por mais tempo. Adicionalmente, o crescimento mais robusto do salário mínimo e a política de expansão de crédito podem gerar pressão de demanda, principalmente nos serviços.

 

2. A Trajetória da Taxa Selic: Entre o Combate à Inflação e o Estímulo ao Crescimento

 

A Taxa Selic, taxa básica de juros da economia, é a principal ferramenta do Banco Central para controlar a inflação. Sua projeção para 2026 reflete o equilíbrio delicado entre a necessidade de combater a inflação e a pressão para reduzir os custos de empréstimos e financiamentos, estimulando o Produto Interno Bruto (PIB).

 

Projeções da Selic para 2026

 

  • Mercado (Focus): As projeções de mercado indicam que a Selic deve fechar 2026 em torno de 12,25% a 13,00% ao ano.
  • Governo (PLOA): A estimativa do governo, no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2026, é um pouco mais otimista, projetando a Selic em torno de 13,11% ao ano.

 

O Risco de “Expectativas Desancoradas”

 

Apesar da expectativa de queda em relação aos patamares de anos anteriores, a Selic de 2026 ainda deve ser considerada alta em termos reais (descontada a inflação). Isso indica que o BC permanecerá cauteloso, pronto para trincar os dentes e segurar os juros se as expectativas de inflação se desviarem da meta, especialmente devido ao cenário fiscal incerto. O Banco Central tem sido claro: a política monetária será significativamente contracionista por um período prolongado para garantir a convergência da inflação.

 

Impacto Direto

 

  • Custo de Capital: Juros altos encarecem o crédito para empresas e consumidores, desacelerando investimentos e consumo.
  • Dívida Pública: Um dos maiores impactos é sobre o custo de rolagem da dívida pública, o que agrava o desafio fiscal do governo.

 

3. Produto Interno Bruto (PIB): Crescimento Moderado

 

O crescimento do PIB é a medida da atividade econômica e, para 2026, as projeções apontam para um crescimento modesto. A desaceleração esperada é um reflexo direto do impacto da política monetária restritiva, que visa arrefecer a demanda para controlar os preços.

 

Projeções do PIB para 2026

 

  • Mercado (Focus): As projeções de mercado giram em torno de 1,78% a 2,00%.
  • Governo (PLOA): O governo projeta um crescimento um pouco maior, de 2,44%.

A diferença entre as projeções do governo e do mercado costuma ser explicada pela tendência do governo em basear seu orçamento em um cenário mais otimista de arrecadação, que depende de um crescimento maior.

 

Os Motores do Crescimento

 

  1. Consumo das Famílias: Deve ser o principal motor, sustentado pela estabilidade (ainda que lenta) do mercado de trabalho e pelos programas sociais.
  2. Investimento (Formação Bruta de Capital Fixo): Deve ser o componente mais afetado pela Selic alta, que encarece o capital para projetos de longo prazo. A melhora só virá com uma queda consistente e percebida dos juros.
  3. Setor Externo: O agronegócio e as exportações de commodities continuam sendo um pilar de sustentação, beneficiados, em parte, por um câmbio mais desvalorizado e pela demanda global.

 

4. Política Fiscal e Monetária: O Nó Cego da Economia

 

A principal dinâmica da economia em 2026 será a interação (e, muitas vezes, o conflito) entre as políticas fiscal e monetária.

 

Política Monetária (Banco Central)

 

O BC tem sinalizado uma postura de rigor e cautela (hawkish), mantendo os juros altos pelo tempo necessário para ancorar as expectativas de inflação na meta. A manutenção da Selic alta, mesmo sob pressão, reflete o compromisso com a estabilidade de preços, sendo esta a principal contribuição do BC para o crescimento sustentável de longo prazo.

 

Política Fiscal (Governo Federal)

 

A política fiscal é o calcanhar de Aquiles para 2026. O ano é o primeiro em que o governo precisa, sob o Novo Arcabouço Fiscal, entregar um resultado primário positivo (superávit, ou seja, receitas maiores que despesas, excluindo o pagamento de juros da dívida).

Indicador Meta Fiscal (Novo Arcabouço) Desafio
Meta de Resultado Primário (2026) Superávit de 0,25% do PIB Projeções de mercado indicam alto risco de déficit, forçando a equipe econômica a buscar novas receitas e/ou a cortes de gastos, ou, mais provável, a revisar a meta fiscal para baixo.

A incerteza sobre o cumprimento da meta fiscal é o fator de maior risco:

  • Se o governo falhar em demonstrar credibilidade fiscal, o risco-país aumenta, o dólar sobe, e o Banco Central será forçado a manter os juros ainda mais altos.
  • O aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda (para quem ganha até R$ 5 mil), se aprovado, embora positivo do ponto de vista social, gera uma perda de arrecadação que exige compensação via novas receitas ou cortes de gastos.
  • Estudos de mercado apontam para uma “inviabilidade” da política fiscal, devido à rigidez de gastos (piso para saúde e educação) e às despesas obrigatórias (Previdência, assistência), que seguem uma trajetória de alta.

A chave para 2026 é se o governo conseguirá implementar um ajuste fiscal crível, equilibrando a busca por novas receitas (tributação, dividendos de estatais) com o controle efetivo das despesas.


 

5. Dólar e Investimentos: O Que Esperar

 

O comportamento do dólar e as tendências de investimento estarão intrinsecamente ligados aos fatores macroeconômicos descritos.

 

Taxa de Câmbio (Dólar)

 

Indicador Fonte Projeção para o Fim de 2026
Câmbio (Dólar/Real) Mercado (Focus) R$ 5,50 a R$ 6,00

O câmbio tende a ser pressionado por dois fatores opostos:

  • Poder de Atração (Apreciação): A Selic, mesmo em queda, deve permanecer em patamar alto o suficiente para manter um diferencial de juros atraente em relação às economias desenvolvidas (EUA e Europa). Isso atrai capital estrangeiro para a renda fixa brasileira, o que tende a segurar a cotação do dólar (R$ 5,50).
  • Fuga de Capital (Desvalorização): A instabilidade fiscal e o aumento do risco-país podem afastar o capital externo. Se o governo sinalizar uma desancoragem fiscal, o mercado pode precificar o risco, e o dólar pode voltar a se aproximar de patamares mais altos (R$ 6,00 ou mais).

A tendência mais provável é de volatilidade, com o câmbio flutuando em torno de R$ 5,50, mas altamente sensível a cada sinalização sobre a meta fiscal.

 

Tendências de Investimento

 

O cenário de 2026 favorece a diversificação e a cautela:

  1. Renda Fixa (Pós-Fixada): Com a Selic ainda alta, mesmo em trajetória de queda, títulos pós-fixados (CDBs, LCIs, LCAs e Tesouro Selic) continuam sendo uma excelente opção, garantindo retornos reais (acima da inflação) e liquidez.
  2. Renda Fixa (Prefixados e IPCA+): A incerteza quanto à velocidade da queda da Selic sugere cautela em prefixados longos. Já os títulos atrelados à inflação (Tesouro IPCA+) podem ser uma boa proteção, especialmente se o risco fiscal se concretizar, pressionando a inflação.
  3. Renda Variável (Ações): O mercado de ações tende a se tornar mais atraente no segundo semestre de 2026, à medida que a Selic cair. Empresas com receitas atreladas a exportações (dólar alto), e setores de infraestrutura e commodities, devem ter performance positiva. Ações de empresas de consumo interno (varejo, serviços) só devem deslanchar com uma queda significativa dos juros.
  4. Investimento Estrangeiro: A entrada de Investimento Estrangeiro Direto (IED) deve ser concentrada em projetos de longo prazo e setores com alta produtividade (como o agronegócio e energia renovável), menos sensíveis à volatilidade cambial e de juros, mas atenta ao ambiente de negócios e reformas.

 

Conclusão: Navegando entre o Ajuste Monetário e a Responsabilidade Fiscal

 

O panorama econômico brasileiro para 2026 é um jogo de paciência. O Banco Central continuará fazendo o seu trabalho de controle inflacionário, mantendo o custo de capital elevado e, consequentemente, segurando o ritmo do PIB. No entanto, a eficácia total desse esforço está refém da Política Fiscal.

A principal perspectiva é que 2026 será o ano em que a economia testará o novo Arcabouço Fiscal. A sustentabilidade do crescimento, a queda consistente da Selic e a estabilidade do câmbio dependem crucialmente da capacidade do governo em demonstrar responsabilidade fiscal e cumprir (ou ao menos buscar um caminho crível para cumprir) sua meta de superávit primário.

A palavra-chave para o investidor será seletividade. Enquanto a renda fixa oferece proteção e retorno real com juros ainda altos, a renda variável começará a sinalizar oportunidades para quem souber antecipar o ciclo de queda da Selic. O dólar flutuará, reagindo a cada passo (ou tropeço) nas contas públicas.

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